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AS CARTAS DO BTS: Mergulhando nas letras das faixas solo de WINGS

BEGIN


“Begin” é a faixa que abre a sequência de músicas solo (ou individuais) dos membros em WINGS. E é interessante mencionar que esse foi o primeiro álbum em que o BTS construiu essa proposta - de, além de músicas grupais e de subunits, também apresentar faixas individuais. Isso porque havia aspectos que diziam respeito a cada membro, bem como a cada personagem do BTS Universe em desenvolvimento, que poderiam ser transformados em música e arte também de forma separada, certo? Então, para cada uma das sete faixas solo de WINGS que vamos discutir hoje, pedimos que você leve isso em consideração: o ser humano, artista e membro do BTS ali, mas também o personagem do BU e como esses dois lados conversam entre si.


“Begin”, então, é a música solo do Jung Kook e nos conta sobre como ele veio a Seul e conheceu os membros do BTS, o que ele sentiu e pensou ao longo desse processo, e como ele se transformou no que é também graças aos membros. Isso fica muito evidente quando ele canta “O eu de 15 anos que não tinha nada / O mundo era tão grande e eu era tão pequeno” ou ainda “Graças aos meus hyungs eu passei a ter emoções / Eu me tornei eu”. Em uma live que RM fez na época para comentar um pouco sobre os bastidores de produção do álbum, ele contou que, no início, Jung Kook tentou escrever a letra de “Begin” sozinho, já que tratava da sua própria história, mas que acabou achando extremamente difícil. Então, ele pediu que Namjoon escrevesse a letra para ele a partir das suas experiências. RM disse na época que relembrou o que Jung Kook disse quando os membros do BTS estavam conversando certa vez sobre sofrimento e dificuldades individuais. Ele conta que, nesse dia, Jung Kook disse chorando: “Não houve nada que fosse difícil para mim. Eu entrei muito jovem, assinei um contrato sem saber de nada, cantei e dancei porque era isso que eu queria. O que me dói são os membros, que estão me ajudando e morando comigo, sofrendo”. Nós podemos ver esse sentimento e esse momento refletido na letra quando, por exemplo, Jung Kook canta “Eu sinto como se estivesse morrendo quando meu hyung está triste / Quando meu hyung está em dor, dói mais do que quando eu estou em dor”


Mas não tem como... A parte da letra de “Begin” que, talvez, seja a mais bonita e a mais emocionante está no refrão, onde Jung Kook repete várias vezes o verso “Você me faz começar”. A repetição soa intencional, como se fosse um recurso poético para uma maior força expressiva do quanto o que ele está cantando significa, de fato, para ele. Quando Jung Kook canta que são os demais membros, os seus hyungs, que fazem ele começar, ele indica de forma muito bonita que, no início do que é e da potencialidade do que pode ser o Jeon Jung Kook, ali também estão os hyungs. Como se, para a organização da sua própria identidade, houvesse a inspiração e a presença dessas seis pessoas tão importantes em sua vida. Por isso, “você me faz começar”


Olhamos pelo lado do Jung Kook ser humano e artista. Mas e o lado do Jungkook, nosso personagem do BTS Universe? Sempre lembrando que a história do BU e dos personagens é FICTÍCIA, beleza? Bom, como sabemos, o Jeon Jungkook do BU é ali também o mais jovem dos 7 meninos. Ele tem uma história e uma convivência familiar bastante complexa, o que trouxe várias complicações, especialmente negligência e solidão para ele. É por isso que sempre dizemos que, também na história, os outros meninos, os hyungs, são realmente como irmãos mais velhos para ele, como a família que ele nunca teve e que diminuem, pelo menos um pouco, o grande medo que ele tem, que é de ficar sozinho. Há uma passagem na história do BU em que o Jungkook fala a seguinte frase: “Todas as minhas histórias existiam dentro das histórias deles [dos hyungs] e eu existia apenas nas minhas conexões com eles”. Essa fala, tão bonita quanto o que Jung Kook canta na letra de “Begin”, revela a natureza e a profundidade dessa relação entre eles e o impacto dela sobre Jung Kook. Então, seja para o ser humano-artista ou para o personagem, Jung Kook tem nos seus hyungs o seu começo.



 


LIE


“Lie” é a faixa individual de Jimin em WINGS e a letra da música parece retratar um conflito interno que ocorre a partir da tentativa de escapar de mentiras e tentações. Isso foi colocado pelo próprio Jimin na live de pré-lançamento de WINGS, a WINGS Preview Show. Além disso, foi o próprio Jimin que escreveu a letra da música, segundo ele, com base no seu próprio passado e experiências que ele viveu. Também na live que RM fez na época para comentar um pouco sobre os bastidores de produção do álbum, ele contou que Jimin costumava se culpar muito por supostas falhas, por não atingir determinadas expectativas ou padrões e que ele acabava se ocupando, sofrendo, com pensamentos como “Eu não sou bom o suficiente” ou “Eu sou mau, eu sou ruim”. Então, é esse conflito pessoal, extremamente íntimo, de Jimin que vemos refletido na letra dessa música.


Mas nós também podemos e devemos observar como o personagem do BU Jimin foi contemplado dentro dessa música, não é? O Jimin do BU, quando era só uma criança, passou por um trauma imenso, uma experiência que marcou ele profundamente. Então, o que nós vemos é o personagem basicamente viver sustentando o peso de um segredo, vemos ele mentir sobre o que é esse trauma, talvez inclusive por ser insuportável de se lidar. É um conflito interno do personagem com essa experiência traumática que passa a ser refletido também em uma luta em relação à sua própria saúde mental.


Então, quando, em “Lie”, Jimin canta “Preso em uma mentira / Por favor, encontre o eu que era inocente / [...] Eu não consigo me libertar desta dor / [...] A mentira crescente está tentando me engolir, me devorar”, vemos no sofrimento e na angústia dessa letra o Jimin ser humano-artista e o Jimin personagem.



 


STIGMA


Vamos à “Stigma”, a música solo com a marcante high note do V. Essa faixa tem uma letra muito poética, mas também muito misteriosa na angústia que ela apresenta. Na live que RM fez na época, ele debateu sobre como a letra de “Stigma” dialoga perfeitamente com o personagem de Taehyung no enredo do BU, mas que ele suspeitava que, de alguma maneira, na letra também poderia haver um segredo pessoal muito grande do V. É como sempre dizemos, é importante ter a sensibilidade e o cuidado de não colocar palavras na boca dos membros, afirmando que ele quis dizer coisa x ou y. No entanto, certamente podemos olhar para essa letra buscando entender os sentimentos que Taehyung tentou compartilhar aqui.


Como já mencionamos para as músicas anteriores, aqui também temos o Kim Taehyung personagem do BU, que é um garoto que tem como pai um homem alcoólatra e bastante violento. A mãe dele abandonou ele e a irmã quando eram ainda bem novos, exatamente por essa situação com o marido. O Taehyung do BU tenta a todo custo esconder de todos tudo o que passa em casa - garrafas e copos de bebida, violência do pai, negligência, presença de polícia e daí em diante. Esse contexto do personagem é fundamental também aqui.


Tem algo que nos captura nessa letra que é o próprio título dela: estigma. Estigma como aquilo que marca. Que pesa. Como uma cicatriz que é deixada por um machucado. E é interessante porque, em um dos DVDs de gravação de shows da era WINGS, nos bastidores, V disse que “Stigma é sobre estar machucado/magoado. Enquanto criava essa música, eu queria que ela fosse sobre ser machucado de novo e de novo e de novo. Eu queria que o ARMY sentisse a minha dor. No MV, eu sou retratado como alguém que sofre tanto que me torno alguém que aprecio a dor”. Por isso, estigma. E nos explica o porquê da analogia que ele também constrói na letra em cima da ideia de pecado. “Você está me chamando de pecador?”, é o que ele pergunta. Sabemos que o pecado, na lógica cristã em que se constrói, é uma violação a uma norma, ao que é esperado ou determinado. É uma desobediência ou um erro que traz consigo um peso de sofrimento, uma culpa, uma marca pela desobediência a algo, por exemplo. Então, uma coisa dialoga com a outra, implicando algo que marca uma pessoa pelo tamanho sofrimento que causa, de forma que a letra de “Stigma” parece ser quase um grito silencioso por ajuda.


É interessante ainda quando, no refrão da letra, vemos ele cantar o verso “Copos irreversivelmente estilhaçados”. Essa nos parece ser uma referência até bastante específica à situação do Taehyung personagem do BU com seu pai, as garrafas e copos de bebida e a violência que vem a partir deles, além de como o personagem se sente quase impotente diante disso. A relação da sua família se construiu assim, tendo na sua base a violência e “copos irreversivelmente estilhaçados”. Não tem nada que ele possa fazer a respeito. Além disso, ali na letra, nós vemos também sendo mencionado várias vezes um outro alguém que é punido em vez dele ou no lugar dele. Em relação ao personagem do BU, isso nos leva a pensar na sua irmã e na sua mãe. Talvez um sentimento de culpa, como dissemos, por não poder ou não conseguir fazer nada. Como se desejasse que apenas ele fosse punido e não esse outro alguém. Agora, quais segredos e experiências profundas de Kim Taehyung, ser humano-artista, se escondem também nas metáforas dessa letra, não cabe a nós indicarmos o que são. Apenas ouvir e abraçar a dor e o sofrimento que ele desejava, naquela época, compartilhar para que sentíssemos junto com ele.



 

FIRST LOVE


“First Love”, que significa “Primeiro amor”, é a faixa solo de SUGA e é uma música muito densa e muito emocionante. Em uma entrevista de Yoongi no WINGS Concept Book (livro-conceito lançado na era WINGS), ele disse que essa é uma música que contém muitos significados, que se refere ao piano que ele tocava quando era jovem e que ele chorou muito durante a gravação. Assim, SUGA constrói seu rap e canta nessa letra sobre esse “piano marrom assentado no canto da sua memória e da casa da sua infância”, descrevendo esse relacionamento - não apenas entre ele e o piano, mas entre ele e a música de forma mais geral - de maneira cronológica.


Antes de olharmos para essa construção cronológica, é essencial vermos também aqui a conexão com o Yoongi personagem do BU - personagem que vem de uma família muito rígida e, para piorar, que enfrentou uma tragédia envolvendo a sua mãe, que foi inclusive quem ensinou ele a tocar piano e trouxe essa conexão com a música e o instrumento. Basicamente, quando ele tinha cerca de 15 anos, acontece um incêndio na casa da família, sua mãe acaba presa lá dentro e vem a falecer. Então, mãe, piano, música e por aí vai também tem tudo a ver com o personagem Yoongi.


Na letra de “First Love”, o que nós encontramos é Yoongi narrando vários momentos da sua história e também um diálogo muito bonito entre ele e esse piano que incorpora, personifica a sua relação com a música ao longo de sua vida até ali. Então, vamos tentar seguir a ordem do que ele vai apresentando a partir da própria organização das estrofes da música.


Primeiro, temos um Yoongi ainda criança. Ele diz que o piano era ainda mais alto que ele e descreve a sensação de quando os seus dedos ainda pequenininhos caminhavam sobre as teclas do piano. É nesse trecho que encontramos também o verso em que ele canta “Eu me sinto tão bem, mãe, eu me sinto tão bem”, que coloca em destaque a relação Yoongi x piano x mãe que comentamos.


Já em uma segunda estrofe, Yoongi descreve a época em torno da escola primária - que, no sistema escolar sul-coreano, seria mais ou menos entre os 8 e os 13 anos. Yoongi canta sobre como ali ele já tinha se tornado mais alto que o piano, mas que nessa época também começou a negligenciar esse piano ou a música, em maior escopo. “Eu ainda não sabia o seu significado”, é o que ele diz no diálogo com o instrumento. Também nesse diálogo, vemos o piano dizendo de uma certeza de que eles se veriam novamente em algum momento, se reencontrariam.


Na próxima parte da música, Yoongi fala que, com cerca de 14 anos, ele encara de novo aquele piano e que essa época, esse momento foi como uma virada de chave. Yoongi diz que o momento de estranhamento entre os dois foi curto porque rapidamente ele se sentiu plenamente aceito pelo piano, acolhido pela música novamente. É como se ele começasse a entender o significado da música e o impacto dela em sua vida e, por isso, ele canta o verso “Jamais solte a minha mão porque eu também não soltarei a sua”.


Finalmente, quase no final da música, Yoongi começa a narrar na letra os anos finais da sua adolescência, tempos mais recentes ali, já em um contexto do ser trainee, do desejar ser artista e de tudo que sabemos que eles enfrentaram antes e depois de se tornarem o BTS. Por isso, SUGA fala sobre memórias sendo construídas junto ao piano, à música, de forma desesperada e apaixonada, fosse chorando ou rindo. Como se a música fosse tudo em que ele podia se agarrar. É aqui também, na letra, que vemos ele mencionar o acidente que sofreu no verso: “Segurando meu ombro esmagado, eu disse que realmente não conseguia mais fazer isso”. Ele se refere a aquela vez quando, antes de debutar, Yoongi trabalhava meio período como entregador com uma moto, sofreu um acidente e machucou gravemente seu ombro, o que trouxe dor e consequências por muito tempo, como bem sabemos. Mesmo diante disso, nesse contexto difícil de dor, frustração e cansaço, SUGA canta como se, toda vez que ele queria desistir, o piano ou a música lhe dissesse: “Garoto, você consegue!”. É aí que chegamos, na parte final da música, a uma sequência muito bonita e que talvez resuma tudo que Yoongi queria dizer nessa faixa, seja por ele próprio ou pelo desenvolvimento do seu personagem do BU. Ele canta, chorando, para aquele piano e dizendo: “Eu não vou te deixar nunca mais / Porque você, meu começo e meu fim, é aquele(a) que vai testemunhar tudo”. No começo e no fim de Min Yoongi, aí também estará a música e aquele piano marrom.



 

REFLECTION


A música solo de RM em WINGS já começa com um jogo de palavras interessantíssimo no próprio título da música. “Reflection” pode significar tanto uma reflexão, um processo ou momento reflexivo, como também um reflexo, o que vemos quando nos colocamos diante de um espelho, por exemplo. E acreditamos que esse jogo de palavras se torna ainda mais brilhante quando consideramos Namjoon ser humano-artista e membro do BTS e Namjoon personagem do BU.


Kim Namjoon do BU tem uma situação financeira e familiar muito delicada. É por isso que vemos o personagem vivendo num container numa área mais pobre e antiga da cidade e   tentando encontrar meios de conciliar a escola com um punhado de empregos de meio período. Ele carrega sozinho o peso de tentar sustentar a família. É por isso também que a frase “You must survive” ou “Você deve sobreviver” é tão marcante para esse personagem e, geralmente, vemos ela aparecendo, inclusive em MVs, escrita em um espelho embaçado. Como se, no próprio reflexo do personagem no espelho, naquilo que ele é capaz de enxergar de si, houvesse a implicação de uma necessidade de sobrevivência. Então, “Reflection”, já no seu título, tensiona esses dois lados: o peso do reflexo do personagem e a sinceridade da reflexão do artista, que veremos daqui em diante.


Na letra, vemos Namjoon falando sobre o Ttukseom Hangang, mais comumente conhecido como apenas Ttukseom, que é um parque na esplanada norte ao longo do rio Han. Ele diz que vai para o Ttukseom quando está passando por momentos difíceis ou com a cabeça muito cheia de pensamentos, o que é também mencionado no WINGS Concept Book. Mais especificamente na letra de “Reflection”, ele diz que vai ao parque quando sente que ele se odeia. RM inclusive escreveu essa música enquanto estava sentado no Ttukseom e o ruído, os barulhos que ouvimos de fundo no início da faixa é o som que ele gravou com o celular quando visitou o parque. Então, ele disse na época que fez a música como algo que ele ouviria quando fosse caminhar à noite pelo Ttukseom, ao longo do rio Han ou em algum outro lugar fora.


Uma das coisas mais bonitas e marcantes da letra de “Reflection” é que RM escreve de forma muito nua e crua, muito consciente e, ao mesmo tempo, imerso na percepção do seu entorno ali naquele ambiente que ele descreve. Como se ele precisasse ir até aquele lugar, observar aquelas cenas “na escuridão familiar do Ttukseom” para poder olhar a vida sob uma perspectiva mais abstrata, mais afastada, dando um passo atrás. Ele parece precisar se misturar à cena ali para construir a reflexão que ele compartilha na letra. “O mundo é um outro nome para desespero / Minha altura é um diâmetro da Terra”, ele canta, implicando essa presença plena e também difusa naquele espaço, naquele momento.


Gostamos muito também de quando, na letra, ele fala: “O medo que gentilmente se aproxima de mim e segura minha mão”. Porque parece que Namjoon começa a perceber o medo como um “amigo inevitável”, digamos assim, com quem ele precisa aprender a conviver, sobretudo se levarmos em consideração tudo que ele e os membros já haviam passado até ali e enfrentavam no momento com uma maior ascensão. Não é segredo para ninguém a forma como RM menciona frequentemente em letras ou entrevistas o conceito ou a ideia de coexistência, certo? Esperança e desespero, felicidade e tristeza, entre outros, de modo que um inevitavelmente também existe dentro do outro. Mas e o medo? Qual é o seu oposto no qual ele coexiste? E como essa coexistência se dá em nós? Como, sendo o RM do BTS, mas também Kim Namjoon, ele pode segurar a mão desse medo que gentilmente se aproxima e que coexiste inevitavelmente com a confiança e a audácia necessárias para dar os passos dentro desse grupo, por exemplo?


Um outro verso que vale muito a pena mencionarmos aqui é quando ele diz “Eu quero ser livre da liberdade”. Essa fala que parece ser tão simples e, ao mesmo tempo, tão intensa porque traz um questionamento existencial. O que é liberdade? Somos realmente livres? Podemos ser? Como? Quando? Isso me fez pensar em autores como Sartre, por exemplo. Sartre, que foi um filósofo existencialista, construiu umas das concepções mais radicais sobre a liberdade humana. Ele acreditava que nós somos sempre livres, mesmo em situações em que a maioria das pessoas diria que não existe qualquer opção de escolha. Para ele, o ser humano é liberdade, como se fosse algo incondicional, e é isso que Sartre implica e quer dizer quando afirma que estamos condenados a sermos livres. Ele escreveu em um dos seus livros assim: “Condenado porque não se criou a si próprio; e, no entanto, livre, porque uma vez lançado ao mundo, é responsável por tudo quanto fizer". Estar condenado à liberdade significa que não podemos deixar de escolher, porque mesmo não escolher é ainda uma escolha. É o fato humano de não poder não ser livre mesmo sendo a própria liberdade porque a liberdade implica responsabilidade e isso pesa. Gera angústia. Por isso, quem nunca desejou poder ser livre de ser livre? Paradoxalmente, a liberdade, que soa tão leve, é pesada. É aí, diante de todo o conflito interno e a reflexão que RM tão visceralmente revela nessa letra, que ele canta muitas vezes no fim: “Eu gostaria de poder me amar". Essa frase revela como é complexo sequer cogitar o amor próprio em alguns momentos na tensão e na coexistência entre estar feliz e infeliz - como ele fala na música, ou entre a liberdade e a responsabilidade. Então, em resumo, “Reflection” é resultado de um momento de introspecção e uma reflexão íntima que se constrói através da música.



 

MAMA


“MAMA” é a música de j-hope e, segundo RM, também naquela live de bastidores da produção de WINGS, Hobi expressou nessa faixa emoções que ele sentia em relação à sua mãe desde a sua infância - de forma que fica bem evidente o papel super importante que sua mãe teve como suporte e encorajamento para que ele desse passos rumo ao que ele sonhava ou gostaria de realizar. Há muito da história de Hoseok nessa letra. Além disso, entra aqui em cena o Jung Hoseok enquanto personagem do BU - que foi abandonado pela sua mãe em um parque de diversões quando tinha só 7 anos. Assim, já mais velho, vemos que o maior sonho do personagem seria poder reencontrar sua mãe e, finalmente, numa idealização que ele sustenta, eles viveriam felizes. Então, em “MAMA”, como o próprio título da música já entrega, o tópico MÃE é o ponto sensível que une o Jung Hoseok ser humano-artista e o personagem. O homem artista que expressa sua gratidão e uma série de emoções pela mãe e o personagem que sente saudade da mãe que se foi.


Há alguns versos, trechos da música que vale a pena darmos uma olhada porque trazem referências muito interessantes ou muito poéticas. O primeiro que destacamos é quando j-hope canta que “a força da mãe naquele tempo foi uma bola em quebra por mim”. Que bola é essa que ele menciona? Pode parecer confuso, mas, na verdade, há uma referência aqui a uma expressão de beisebol - sim, o esporte. Uma “breaking ball”, como é mais conhecida, no beisebol, significa um arremesso em que o arremessador lança a bola de tal maneira que ela não se move em linha reta, mas vai ganhando curvas e movimentos diversos no processo até chegar onde precisa chegar. Por isso, essa é uma analogia tão bonita que j-hope constrói para se referir a força da sua mãe que foi suporte para a sua caminhada. Como se dissesse e reconhecesse na música que, por ele, sua mãe havia mudado de direção e movimento à medida que era possível e necessário. A força da sua mãe, em adaptação ao longo do tempo por amor ao filho ou aos filhos, servindo de inspiração para que ele desejasse tanto alcançar o que ele queria alcançar.


Outro detalhe interessante e bonito aqui em “MAMA” é que parece que temos referência a uma canção infantil coreana e a um ditado popular coreano, ambos dialogando com a questão do ser mãe ou do amor de mãe. Essa possibilidade foi levantada por ARMYs locais, coreanas, em torno da época do lançamento, com um olhar cuidadoso sobre a letra. A referência à cantiga infantil estaria no verso em que j-hope canta: “Eu sinto muito, mamãe, por perceber seu amor amplo como o céu apenas agora, mamãe” e o nome da cantiga é “Favor de mãe”. A letra dessa música infantil diz originalmente que: “Embora digam que o céu é alto, tenho outra coisa que é alta / O favor da mãe que me deu à luz e me criou / Acho que é mais alto que o céu azul / Embora digam que o mar é amplo, tenho outra coisa que é ampla / O favor da mãe que me ensina a ser um bom humano / Acho que é mais amplo que o mar azul”. Já a referência a um ditado popular pode ser encontrada no verso que diz “Apenas a sua mão cura tudo”. Segundo locais, a tradução mais direta do ditado em coreano seria “A mão de mãe é mão de remédio” e ela se refere, por exemplo, a como quando uma criança tem dor de estômago, a mãe deita ela e esfrega lentamente sua barriga com a mão quente. Parece que há também uma música que é cantada junto com esse movimento e a letra varia de acordo com regiões e famílias, mas quase sempre começa com “A mão da mãe é mão de remédio” e daí a referência aqui na música.


Por último, destacamos o trecho em que j-hope canta “Cibercafé Hiddink de Munheungdong, restaurante Broadway / Uma veterana correndo por aí sobre seus dois pés por sua família”, levando em consideração que Munheungdong é uma área da cidade de Gwangju, cidade natal de Hoseok. Então, esses dois versos parecem nos contar que a mãe de j-hope teria, inclusive, trabalhado em dois empregos para apoiar o sonho dele e outras questões familiares, claro. É por isso que, em tom de gratidão, Hobi diz para sua mãe, na letra, que “Porque você fez de você um fertilizante para um pequeno broto / Eu serei uma flor e me tornarei o seu próprio caminho de flores”.



 

AWAKE


“Awake” é a faixa solo de Jin e foi a primeira música em que Jin participou da composição, inclusive da melodia, sendo muito elogiado por Namjoon, por exemplo. Naquela mesma live de bastidores do álbum, RM disse que a letra de “Awake” representa muito a própria personalidade do Jin. Mas, para além disso, temos aqui também uma presença muito forte de Kim Seokjin, personagem do BU, como em todas as outras faixas solo.


Kim Seokjin do BU é também o mais velho dos sete meninos. Apesar de vir de uma família muito endinheirada, o contexto familiar dele é bastante complicado. Ele perdeu a mãe muito jovem, o pai dele é uma pessoa fria e distante e o que é colocado para nós é que o que esse personagem mais deseja é se tornar uma boa pessoa por fazer outras pessoas felizes. Isso diz muito também de como o personagem se relaciona com os outros seis meninos, que se tornam amigos e pessoas tão importantes para ele, a ponto de que, quando o personagem começa a descobrir a situação em que os seus antigos amigos de escola estavam, as tragédias que tinham acontecido com eles, as coisas se complicam e a história se intensifica com Seokjin começando as suas voltas no tempo, tentando consertar tudo e salvar os seus amigos. Esse eterno recomeço como destino é o que passa a mover o personagem num certo ponto da história, além de toda a fragilidade da situação. Afinal de contas, é possível mesmo salvar todo mundo?


Temos algumas referências bem específicas na letra. Primeiro, temos um trecho em que Jin canta “Talvez eu jamais consiga voar como aquelas pétalas de flores”. Pétalas de flores são uma referência super marcante do BU, especialmente na era HYYH lá em 2015 e 2016! Inclusive, no início do MV de I NEED U, vemos Seokjin segurando 6 pétalas de flor em sua mão e, em seguida, ele solta elas, de modo que elas caem. As pétalas caindo são uma representação visual para as voltas no tempo, as mortes, os recomeços… Enfim, gritam BU.


Outro trecho importante é quando Jin canta o seguinte: “Os meus tempos felizes me perguntaram ‘Você está bem?’ [...] Eu respondi que não. Eu estou com tanto medo. Mas, segurando seis flores firmemente em minhas mãos, eu estou apenas caminhando”. Os tempos felizes, para o personagem, dizem respeito ao tempo em que os 7 meninos se conheceram na escola, se aproximaram e fizeram uns dos outros e dessa amizade uma família, um espaço para ser jovem, um refúgio. É sobre a história dos 7 juntos e o que essa história significou para cada um. Por isso, naquele ponto da história mais à frente, se deparando com as desgraças que haviam acontecido na vida dos seus amigos e tentando retornar ao passado para resolvê-las, a fim de que pudessem se reencontrar todos vivos para serem felizes juntos novamente, Jin canta aqui sobre medo. Sobre não estar bem por estar com medo de que não consiga fazer isso pelos seus amigos - amigos que entram aqui representados pelas 6 flores que ele menciona. “Segurando seis flores firmemente em minhas mãos, estou apenas caminhando”. Repetidas vezes tudo seguia dando errado, mas Kim Seokjin do BU continuava tentando, se agarrando às seis flores, ou melhor, aos seis amigos que ele gostaria de poder salvar. Porém, nesse verso aqui, poderíamos dizer que há muito significado também para Kim Seokjin ser humano-artista e membro do BTS - de modo que, mesmo em meio às dificuldades e desafios que encontrou ao longo da sua jornada, Jin continuou tentando, trabalhando e se aprimorando com confiança também nos demais membros do BTS.


Esse desejo de continuar tentando, de seguir em frente - seja do personagem ou do artista - também fica evidente quando Jin canta versos como “Esse é o meu destino” ou “Eu quero tentar correr só um pouco mais” ou “Eu ainda quero lutar, fazer esse grande esforço”. Assim, “Awake”, além de trazer à tona emoções e pensamentos muito particulares de Jin, também diz da natureza da relação entre os 7 e o que essa relação inspira neles - seja entre o BTS ou entre os personagens do BU. É por aí também que podemos interpretar o título da música: “Awake” ou “Desperto”, plenamente acordado. Como Jin canta na letra, “totalmente desperto, não chore, sem mentira, totalmente desperto”. Estar desperto, nesse estado de vigília, é estar, em alguma medida, consciente de si mesmo e do mundo ao redor, bem como do que precisamos ou desejamos fazer. 


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1 Comment


Duda
Sep 23

Oii, onde a gente pode ver osa posts que eram do twitter? Vocês vao postar no Blue Sky ou algum outro lugar?

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