A Hamilton Lugar: School of Global and International Studies, em parceria de patrocínio com a Indiana University Institute for Korean Studies e a Embaixada da República da Coreia nos Estados Unidos, tem promovido uma sequência de palestras onlines e gratuitas sob o tema “O impacto da cultura popular coreana na América do Norte”. No entanto, na noite de ontem, dia 22 de outubro de 2020, o tema da apresentação capturou a nossa atenção e nós não poderíamos deixar de participar para aprender um pouco mais e também compartilhar essa discussão em Português com você!
O título da palestra apresentada ontem foi “BTS e ARMY: Uma experiência sinérgica em um fandom transcultural”. Incrível, não é mesmo? Porém e antes de mais nada, é essencial apresentarmos a palestrante. A Doutora Candace Epps Robertson é uma professora-assistente e pesquisadora na Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos. Além disso, a Dra. Robertson também é uma das autoras de um projeto de pesquisa chamado #BTSSyllabus, que tem como objetivo criar um arquivo participativo de materiais relacionados ao BTS que possam contribuir para outras pesquisas e ajudar a preservar historicamente as informações sobre o grupo e o fandom para gerações futuras.
Bom, nosso objetivo é introduzir aqui, então, um breve resumo ou alguns tópicos importantes e reflexões essenciais levantadas pela pesquisadora. Vamos lá:
Primeiramente, talvez, ao olhar o título da palestra, você tenha se perguntado “Sinérgica? O que é sinergia?”. Chamamos de sinergia quando “uma ação associada de dois ou mais órgãos, sistemas ou elementos leva a um resultado que seja a execução de um movimento”. Trazendo ao nosso contexto, a grande questão é: na ação associada ou na unidade entre BTS e ARMY, qual é o movimento que surge como resposta e como ele surge?
Assim, toda a palestra da Dra. Robertson se baseou em três perguntas fundamentais:
Quem são as pessoas que compõem a comunidade ARMY?
Que tipo de mensagens têm sido compartilhadas pelo BTS e como o ARMY responde a elas?
O que as experiências de ARMYs podem nos mostrar sobre possibilidades de troca cultural e educação?
Antes de começar a responder esses questionamentos, a Dra. Robertson, ao nos colocar diante desse mapa (vídeo abaixo) produzido pela pesquisadora e administradora do perfil @ResearchBTS, trouxe uma pergunta ainda mais intrigante: Como é possível que esses 7 jovens da Coreia do Sul sejam o ponto em comum que une pessoas de todos os cantos do planeta e move essas pessoas a tomarem ações sobre elas próprias, sobre os outros e sobre o mundo em si?
Nosso primeiro passo aqui, então, deve ser relembrar ou entender quem é o BTS.
BTS enfrentou incontáveis obstáculos desde o dia 1. Sua popularidade levou tempo e esforço para ser construída. Entretanto, o que jamais mudou são as mensagens poderosas compartilhados pelo grupo e a forma como se conectam com o fandom. De “Bulletproof Boy Scouts” (“Escoteiros à prova de balas”) a “Beyond The Scene” (“Além da cena”), BTS se posicionou como um escudo para uma juventude que enfrenta lutas e estereótipos. Eles nos contam estórias, entregam mensagens com a maior sinceridade e profundidade possíveis e isso deve ser reconhecido.
Para além disso, BTS, junto à Big Hit Entertainment, tem renovado a forma como fãs podem experienciar arte e música em uma variedade de conteúdos. Sua música - que atravessa gêneros musicais e conceitos como inspiração - e seus MVs, as coreografias e interpretações detalhadamente desenvolvidas, projetos como “Connect, BTS” e o próprio BTS Universe são exemplos nítidos desse movimento.
Devido a isso, o grupo recebeu, até então, incontáveis prêmios e menções de honra, além dos recordes batidos e, constantemente, superados por eles próprios. Isso se justifica não apenas pela qualidade e profundidade de seus trabalhos, mas também pelo seu papel enquanto catalisador e promotor da cultura coreana. A Coreia tem sido culturalmente, historicamente, linguisticamente explorada por pessoas de todo o mundo graças ao BTS.
Depois de refletirmos sobre quem é o BTS, o próximo passo pode ser nos questionarmos: Quem é o ARMY? Caso você não saiba, ARMY é, na verdade, uma sigla para “Adorable Representative M.C. for Youth”, o que significa “Adorável Representante para a Juventude” e carrega um significado gigantesco.
É interessante pensarmos que pessoas se juntam a um fandom ou a um grupo, antes de mais nada, como indivíduos que já possuem uma visão de mundo, cultura e conhecimentos. No ARMY isso não é diferente e a melhor parte é que podemos observar, seja “na vida real” ou por meio das redes sociais, uma integração desses variados aspectos, resultando em uma comunidade global e absolutamente diversa.
Este ponto, em particular, é essencial, pois é inegável o tamanho estereótipo existente em relação a fandoms, sobretudo se esses são voltados a grupos masculinos. Você provavelmente já deve ter se deparado com alguém dizendo que “ARMYs são adolescentes escandalosas” ou, talvez, que “ARMYs são pessoas com mais de 40 anos e com muito tempo livre”. Antes de mais nada, qual é o problema em ser um fã adolescente entusiasmado ou um fã de idade mais avançada que usufrua de seu tempo livre para desfrutar do que o BTS apresenta ao mundo? NENHUM. No entanto e para além disso, a comunidade ARMY é muito mais diversa do que se possa imaginar ou definir.
Projetos como o BTS ARMY Census, promovido ao redor do globo por meio do Twitter e em mais de 40 línguas, nos ajudam a compreender um pouco melhor a demografia dessa imensa comunidade que compomos. A verdade é que o ARMY é uma comunidade profundamente dinâmica, bem como o próprio BTS, e por isso é tão complexo e, talvez, precipitado tentar defini-los. Porém, por meio de pesquisas como essa citada, podemos descobrir que somos muitos e somos plurais, seja em relação a idade, gênero, etnia ou profissão.
Ser ARMY não se limita a ter o Membership. Não se limita a querer explorar teorias. Nem mesmo se limita a querer apreciar a boa música. Há muitos caminhos e modos de se conectar ao BTS. Talvez você tenha conhecido o grupo através de um amigo ou um familiar ou talvez tenha sido uma música tocando na rádio. Talvez você tenha encontrado eles como lugar seguro e de cura em meio à pandemia e à quarentena ou talvez você tenha assistido um vídeo no YouTube e, cinco meses depois, você percebe “Nossa, eu só queria saber o nome deles”. Cada ARMY tem sua história e experiência dentro desse movimento.
Todavia, chegamos à questão principal: O que conecta BTS e ARMY? Como se dá essa união a ponto de gerar tamanho movimento em tantos lugares diferentes?
Como boa estudiosa da retórica, a Dra. Robertson nos apresentou três termos: CONVITE + RESPOSTA = CONECTIVIDADE. Em outras palavras, queremos entender como o BTS compartilha mensagens e como o ARMY escolhe recebê-las. Essas mensagens são encontradas não apenas em suas músicas e demais trabalhos, mas também em seus discursos e ações. Podemos citar como exemplo o discurso de NamJoon na Assembleia Geral da ONU ou que tal a doação e posicionamento do grupo diante do movimento #BlackLivesMatter?
Além disso, é interessante percebermos como, em seus trabalhos, BTS sempre nos dá espaço aberto e livre para interpretação. Além da dimensão coletiva do fandom, as mensagens construídas pelo BTS podem e devem ser exploradas também na dimensão individual. E é por meio da exploração nessas diferentes dimensões que o ARMY se torna uma comunidade que constrói e compartilha conhecimentos diversos e infindos.
Mensagens como “Love Yourself” (Ame você mesmo), “Speak Yourself” (Fale por você/por quem você é) ou “Explore the Map of the Soul” (Explore o mapa da alma) podem, às vezes, parecer tão simples diante das realidades que nos cercam. Porém, elas têm SIM peso e relevância sobre a nossa geração, principalmente dados os contextos atuais.
Assim, em meio a esses processos de troca cultural e educação que vivenciamos, esses são alguns exemplos de respostas que podemos observar dentro da comunidade ARMY diante dos “convites” do BTS:
FILANTROPIA, sendo explorada não apenas em organização para o levantamento de recursos e promoção de ações, mas também em educação, de modo que podemos aprender sobre o que acontece em diferentes lugares e nos educarmos no sentido de caminharmos rumo a um mundo melhor e mais integrado através de amor e conhecimento. Um exemplo ideal para esse ponto foi a criação do OIAA - One In An ARMY, grupo que organiza projetos de caridade e solidariedade a partir da iniciativa de ARMYs por todo o mundo. Outro exemplo dos mais recentes que devemos citar foi o movimento #MatchAMillion, por meio do qual a comunidade ARMY se uniu em pouco mais de 24 horas para levantar, assim como o grupo, a quantia de 1 milhão de dólares como doação ao #BlackLivesMatter. Para além da doação, observamos um nítido movimento de tomada de consciência e compartilhamento de experiências acerca de temas como racismo, desigualdade racial e justiça social, se unindo a iniciativas em diversos países. Dessa forma, mais uma vez, através de histórias e experiências, nos educamos e compartilhamos nossas culturas.
MULTIPLICIDADE DE VOZES, sendo expressa em estudos, pesquisas e, até mesmo, em produções literárias a partir do fandom. The Rhizomatic Revolution Review (Jornal acadêmico online com foco em arte, fandom, efeitos econômicos e forças socioculturais geradas pela soma entre BTS e ARMY), Revolutionaries (Editora de iniciativa de ARMYs que publica também livros a respeito do grupo e do fandom) e tantos outros exemplos comprovam a capacidade de auto organização dentro da comunidade ARMY para produzir conhecimento que transforma não apenas voltado ao BTS, mas igualmente voltado a diversos problemas e questões que nos cercam.
AUXÍLIO E EDUCAÇÃO ENTRE ARMYs, sendo observada nas teorias e na exploração dos trabalhos do grupo por meio de interpretações, experiências, conexões e pensamento criativo, bem como nas traduções para incontáveis línguas e pesquisas sobre a história e a cultura não apenas da Coreia, mas de muitos países ao redor do globo. Por isso, as oportunidades de aprender com pessoas dos mais diferentes locais do planeta são infinitas dentro da comunidade ARMY.
Em todas essas e tantas outras “respostas” por parte do ARMY, novamente, o ponto em comum que nos une é o BTS. Essa conexão e unidade transcende a nossa compreensão e o seu impacto é muito maior do que o que podemos imaginar. É fato que, por vezes, temos problemas e dificuldades dentro do fandom, afinal nenhuma comunidade, sobretudo em tais dimensões, está isenta de enfrentar alguns impasses. Todavia, esses devem nos servir como constantes processos de amadurecimento individual e coletivo, fortalecendo ainda mais o ARMY, seu significado e seu objetivo.
É por isso que a sinergia entre BTS e ARMY suscita tamanha curiosidade e tantos questionamentos. Não importa onde ou como você esteja na sua vida, as mensagens que são assim construídas ressoam por todos os lados e permanecem com as pessoas.
Como foi dito antes, há muitos caminhos a se percorrer para e com o BTS. É nessa multiplicidade que surgimos eu e você, ARMY, como partes dessa comunidade e também como agentes de transformação dentro da nossa geração. Como você chegou ao BTS? Por que você (ainda) está aqui? O que essa comunidade significa para você? É hora de contarmos a nossa história.
Comments