*Tradução livre a partir de texto original publicado em 21 de dezembro de 2021. Caso deseje visualizá-lo, acesse: https://www.vogue.co.kr/2021/12/21/rm%ec%9d%98-%ec%b9%98%ec%97%b4%ed%95%9c-%ec%97%ac%ec%a0%95/
RM, cuja incansável jornada de autodescoberta
demanda a nossa atenção
[VOGUE KOREA]
Conversas com o RM frequentemente se concentram no tópico da eternidade. RM observa o set da nossa sessão de fotos, decorado como um sarangbang moderno (aposentos de visita para estudiosos nobres) e contendo vários adereços, e diz que gosta do jarro lua*. Este tipo de jarro tradicional coreano, que era popular no final da Dinastia Joseon (1392-1910) e tem uma beleza sutil, é atemporal mesmo em 2021.
BTS e Vogue se juntaram logo após o show online do BTS no final de outubro de 2021. RM, que começou a se apresentar em concertos novamente após um hiato de dois anos, está tentando recapturar a sua vantagem. A pandemia da COVID-19 tem sido difícil para muitos tipos criativos, mas para o BTS, ela levou ao nascimento de suas canções em inglês - “Dynamite”, “Butter” e “Permission to Dance” - que foram escritas em uma tentativa de se aproximar aos membros do ARMY por todo o mundo. Isso resultou em um tremendo sucesso para eles. Nesse ínterim, RM celebrou o evento do BTS FESTA 2021 lançando uma nova música solo, “Bicycle”, uma música que anuncia uma nova direção para ele. No entanto, ele também revisitou canções que o BTS havia lançado após 2013 para se preparar para um recente show online. “São músicas que expressam as nossas mensagens sinceras (de coração) daquela época”, ele comenta. “Mas as tendências estão mudando rapidamente e as minhas reações a músicas mudaram muito. Será que ‘Butter’ ou ‘Permission to Dance’ começarão a soar desatualizados depois de um certo tempo?”
RM afirma que ele também mudou. “Eu me acostumei a ‘estar na moda’ (no sentido de caminhar junto às tendências) porque vivo em um meio social onde ‘estar na moda’ é importante, mas não acho que devo continuar vivendo assim. Não sei ao certo como fazer isso, mas eu comecei a querer produzir algo que seja duradouro e atemporal. Estou começando a pensar muito sobre isso neste ponto - afinal, já se passaram quase nove anos desde que me tornei um membro do BTS.”
O BTS, uma boy band cujas canções são esboçadas a partir da vida real, impactou profundamente as nossas vidas. As conexões que construímos com artistas podem ser profundas e poderosas quando as suas letras validam as nossas emoções interiores, como dor e prazer. As letras escritas por RM, que são penetrantemente perceptivas, cerebrais e lindamente expressas, ajudam a iluminar a nossa visão de mundo. Quando pergunto sobre a direção atual das suas letras, RM responde em termos gerais. “No passado”, diz ele, “eu era fortemente limitado a regras como 'Eu deveria fazer isso e aquilo' e estava preocupado em exibir certas técnicas, etc. Atualmente, no entanto, eu me concentro em criar uma certa textura que desejo transmitir de uma forma mais abstrata. Eu desenvolvi a habilidade de pensar em dimensões multissensoriais, incorporando elementos tanto visuais quanto táteis. Eu tomo uma abordagem holística* em relação às letras, melodias, batidas e vozes - todos os elementos da música.”
Qualquer um que esteja acompanhando o RM há um tempo sabe que as suas respostas jamais são unidimensionais. Os passos que ele dá, as palavras que usa e a direção que toma são cuidadosamente considerados. Assim, a resposta dele à pergunta "A mudança de direção foi natural?" também não decepciona. “A palavra ‘natural’ pode se referir a vários pontos de mudança”, diz ele, “mas é difícil de descrever. Passei um tempo ponderando que tipo de adulto eu estou me tornando. Tenho aprendido a me tornar mais consciente das minhas próprias características quando se trata de escolher as coisas de que que gosto e que estão próximas do meu coração. À primeira vista, pode parecer que eu mudei naturalmente, mas, em uma inspeção mais próxima, é algo que eu moldei intencionalmente. Eu passei por períodos dolorosos, mas, olhando para trás, parece natural.”
O BTS, que discursou nas Nações Unidas e se apresentou na Assembleia Geral da ONU, é nosso orgulho e alegria, mas artistas frequentemente possuem deveres e responsabilidades para além de sua música. Quando questionado se ele considera que essas mudanças são musicalmente limitantes ou se elas fornecem inspiração e novas oportunidades, RM respondeu: "Ambos". “Raramente um é igual apenas a um”, continua ele. “Pode ser igual a dois ou até igual a quatro. Representar o próprio país pode ser maravilhoso e pode ser também um fardo. O que é certo é que não é algo que nós buscamos e é improvável que desapareça apenas porque queremos. Acho que é o meu destino aceitar isso como um chamado e fazer aquilo em que sou bom. Em outras palavras, a minha vida pode vir com responsabilidades. Mas esse tipo de vida pode ser divertido e eu pretendo continuar vivendo com essa atitude.”
Ao longo da entrevista, o "DNA único" do BTS é nítido - ou, mais precisamente, o "DNA coreano" do RM. Conhecendo o seu poema de título “I Remember” (“Eu me lembro”), as inúmeras letras que ele escreveu e a sua afeição por pintores coreanos, eu me pergunto se tudo isso veio de um senso de responsabilidade. “Se você me perguntar se isso é intencional ou natural para mim, eu não tenho certeza”, ele responde. “Tomei consciência da minha identidade coreana depois que começamos a trabalhar nos Estados Unidos. Eu entrei na música através do hip-hop, do pop e, naquela época, eu também amava o hip-hop coreano. Diferentes DNAs estão intrinsecamente interligados, mas, de qualquer forma, a atmosfera cultural em que eu nasci e cresci enquanto ouvia música coreana parece estar enraizada em mim. Aquelas primeiras influências ainda estão comigo e isso é natural.” Sua preferência por pintores coreanos floresce de uma atração natural, mais do que qualquer outra coisa. “Acredito que pendurar uma peça de arte na sua casa pode ser uma experiência espiritual. É viver e examinar um pedaço da vida do artista. Isso permite que aquele trabalho respire. Permite que você converse com ele. Gosto de manter as coisas que estão próximas do meu coração (que são importantes, especiais) perto de mim e é por isso que eu comecei a comprar obras de pintores coreanos.”
O BTS está bem ciente do poder da celebridade e aprendeu a usufruir dele de maneira positiva. A influência do BTS no mundo é um fenômeno complexo, mas a influência do RM no mundo da arte vem apenas de um amor por pinturas. “Quando viajávamos para o exterior, nós permanecíamos nos nossos quartos de hotel, exceto quando estávamos trabalhando”, relata RM. “Os únicos lugares que eu podia ir eram os museus. As galerias de arte repletas de Monets ou Van Goghs estavam sempre lotadas, mas quando fiz uma visita em uma manhã de um dia da semana e as tive majoritariamente para mim, eu tive um momento de eureka - um artista que faleceu há cem anos estava se comunicando diretamente com um menino da Coreia. Eu estava com tanta inveja. A partir disso, comecei a procurar e aprender sobre pintores coreanos. Eu sou o tipo de pessoa que mergulha de cabeça quando fico intrigado com algo. Atualmente, sou fascinado pela arte e isso é estimulante. O estímulo intelectual que recebo ao estudar história da arte é imenso.”
Falando sobre arte, RM fica entusiasmado. “Acho que o fato da pintura ser um campo totalmente diferente faz com que ela se torne mais aprazível”, ele reflete. “Quando se trata de pintura, eu posso ser honesto acerca das minhas emoções. Quando se trata de música, é difícil se você se deixar levar por ciúmes porque existem tantos músicos excelentes e novos talentos. Além disso, os pintores têm carreiras realmente longas. Alguns fazem suas primeiras exposições individuais aos 40 anos e alguns não vendem uma única pintura até os 60. Eu, porém, debutei aos 19 anos e me disseram que represento o meu país agora com 27 anos, e as pessoas me perguntam o que vou fazer a seguir. É como se eu tivesse transcendido onde eu deveria estar neste ponto da minha vida. É por isso que quero ter a longevidade dos pintores. Quando visito uma galeria de arte, o tempo parece parar e eu posso refletir sobre mim mesmo.”
Existem várias palavras-chave que descrevem o BTS e todas elas se aplicam também ao desenvolvimento do RM. RM tem buscado a sua identidade, um processo que conduziu naturalmente à criação musical. Ele considera o BTS como uma espécie de milagre e acredita que a sinceridade e os sonhos deles irão prevalecer, tocando a utopia que existe dentro de muitos de nós e ajudando a tornar o mundo um lugar melhor, apesar de tudo. “Eles dizem que precisamos nos concentrar no presente, em vez de perseguir os nossos sonhos”, diz ele. “Acredito que ter um sonho pode ser importante. Espero que haja outras pessoas que ainda mantêm um menininho ou uma menininha em seus corações e que seguem acreditando em valores antiquados, como o trabalho duro e a esperança. Eu frequentemente também me vejo em conflito acerca disso. As expectativas que as pessoas têm em relação a mim e a pressão que eu coloco sobre mim são muito grandes. Imagino que, mesmo que eu trabalhe em uma área completamente diferente no futuro, as pessoas ainda irão esperar que eu realize ou conquiste algo e eu posso não ser capaz de atender a essas expectativas. Acho que ainda estou passando pelo estágio de criação de um rascunho.” Os sonhos continuam fazendo o nosso coração cantar, mesmo quando pautados como triviais. No fim das contas, o sonho do RM é humano. “Eu quero ser reconhecido como alguém para além de membro do BTS e quero criar outros tipos de arte”, diz ele. “Tenho muitos sonhos, inclusive o sonho de morar na quietude do campo, onde eu possa ler e estudar. Eu estou muito feliz agora, mas considero o ritmo de vida bastante pesado. Eu quero encontrar o ritmo certo para mim algum dia.”
O BTS começou como “os meninos que lutam contra o preconceito e a opressão dos adolescentes”. E eles ganharam o apelido de Beyond the Scene, que significa “jovens que se recusam a se conformar com o status quo e que continuam se esforçando para alcançar os seus sonhos”. RM também pensa sobre quem ele pode se tornar e sobre o futuro. “Nós, humanos, prejudicamos o nosso planeta por meio da nossa própria existência porque desperdiçamos recursos e emitimos dióxido de carbono”, ele ressalta. “Eu acredito que todos nascem por uma razão. Espero que cada atividade em que eu me envolva deixe para trás algo significativo. ‘Beyond RM’ significa fazer mais do que apenas compensar o mal que foi feito ao planeta. Trata-se de fazer, ao menos, 110%.” Ao contrário das preocupações que RM expressou ao longo da entrevista, ele pode já ter atingido o nível da imortalidade. Desde os Beatles, nunca mais havia existido um artista que “esperasse que cada palavra, cada verso das minhas letras ajudasse as pessoas a viver”.
*Observações das tradutoras:
1) O jarro lua (dalhangari) é um tipo característico de porcelana branca da era Joseon (1392–1910). É assim chamado por sua forma evocativa, a qual era normalmente feita da união de dois hemisférios de argila. Caso queira saber mais acerca dessas peças, clique aqui.
2) “Abordagem holística” ou “holismo” significa a busca de um entendimento integral de um determinado fenômeno. É uma atitude de abrangência.
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